A trama é quase um compêndio de toda uma mitologia presente em dezenas de filmes do gênero nos anos 70 em filmes como Massacre da Serra Elétrica (cuja refilmagem estréia junho no Brasil), Aniversário Macabro e Quadrilha dos Sádicos (ambos de Wes Craven), sem falar no famoso drama Amargo Pesadelo, citado de forma literal por um dos próprios personagens para contextualizar o que pode acontecer com eles. Ambientada na zona rural da Virgínia Ocidental (classicamente o sul dos EUA é cenário desses filmes, num dado cultural significativo), a trama fala das consequências de um acidente de carro que leva um cara a conhecer outros jovens que estão parados numa estradinha deserta. Esses rapazes e moças (uma delas, Eliza Dushku, famosa pela série de TV Buffy) serão perseguidos e mortos por três homens da montanha geneticamente modificados por relações incestuosas e prática do canibalismo.
Como se vê nada de novo no front... Mas o que interessa em Pânico na Floresta é a honestidade de seus propósitos e a eficiência que com que constrói sua narrativa. Depois de um prólogo padrão (mostrando uma morte misteriosa) entram os créditos iniciais, que logo apresentam a família de criminosos de uma maneira sucinta e acertada, permitindo que o resto do filme, muito mais que contando uma historinha que signifique algo diretamente (não se leva em conta aqui as leituras subliminares sugeridas pelo drama) repouse num puro artesanato, no contar da trama com um trabalho de câmera bom, uma montagem de belo nível, que cria momentos interessantes como o cerco à cabana do posto florestal e a tentativa de fuga desesperada pelas copas das árvores – a boa narração não deixa esconder erros de continuidade que não eliminam a correção dramática. O diretor Rob Schmidt já assinara uma nada desprezível atualização livre de Crime e Castigo (só passou em TV por assinatura no Brasil) que deslocava os conflitos criado por Dostoievksi para um ambiente de vida suburbana e escola de segundo grau dos EUA.
Era um filme modesto apesar de sua fonte básica, como modesto também é Pânico na Floresta. O filme novo do diretor nos faz lembrar dos limites na definição do que é uma obra de terror. Um critério bom, e válido, é o de classificar como terror qualquer obra que enfoque o sobrenatural. Mas aí como ficam filmes como este e os citados no começo do texto, que não trazem o sobrenatural mas espécies de aberrações (físicas e/ou mentais) estranhas ao mundo civilizado, mas de existência já comprovada diversas vezes em crimes dantescos famosos? E os giallo (terror italiano de características peculiares)? Deveríamos classificar tais filmes de suspense, ou a gramática peculiar do terror é que batiza esses filmes enquanto tal?
Lembramos do crime horrível que vitimou no ano passado aqui no Brasil o pobre casal de namorados em Embu Guaçu (e que, claro, alguns sordidamente tentaram desculpar com o mote da exclusão social), e cuja seqüência de acontecimentos não deixa de ter uma certa semelhança com filmes como Pânico na Floresta e os demais. Filmes como estes nos sugerem que a realidade, quando, vez por outra, e em seus piores momentos, atinge um grau tal de desespero e crueldade, explode numa espécie de dimensão paralela ao mesmo tão longe e tão próxima de nós. Mesmo com um susto final ridículo, que parece ter sido colocado para estimular a rejeição à obra, Pânico na Floresta é um bom filme de terror, honesto, bem narrado e que cativa a platéia não-pirracenta.
# PÂNICO NA FLORESTA (Wrong Turn)
EUA, 2003
Direção: ROB SCHMIDT
Roteiro: ALAN B. MCELROY
Produção: STAN WISTON, ROBERT KULZER, BRIAN J. GILBERT
Fotografia: JOHN S. BARTLEY
Montagem: MICHAEL ROSS
Música: ELIA CMIRAL
Elenco: ELIZA DUHSKU, DESMOND HARRINGTON, JEREMY SISTO, EMANUELLE CHRIQUI, KEVIN ZEGERS, LINDY BOOTH, JULIA RICHINGS
Duração: 84 min
site: http://www.wrongturnmovie.com/