Infelizmente, sai ano, entra ano e continua quase inexistente a crítica de Artes Plásticas nos principais jornais do Rio. Não me refiro aqui ao jornalismo de divulgação e informação - este funciona bem -, mas ao texto crítico, de reflexão, que analisa e medeia publicamente as indagações sobre os significados da produção atual.
Não sei se compete a mim, como artista, vir a público falar desta ausência, deste silêncio. Alguns acharão mesmo que o trabalho do artista está só no “fazer” da sua obra. Mas ser artista é, acima de tudo, como cidadão, querer, através da sua obra, ajudar a transformar tantos outros em cidadãos. Cabe, portanto, ao artista analisar e discordar do comportamento de certa crítica que quer nos submeter às suas indecisões de ordem particular no que se refere à política das artes deste país.
Além disso, é quase paradoxal ou no mínimo contraditória uma situação que parece de consenso público: um reconhecimento crescente da Arte Contemporânea Brasileira, dentro do país e no exterior. Pois se aqui nos jornais se fala de um aumento do público de museus, paços, centros culturais etc, isto parece ser desproporcional ao constrangedor silêncio da sua crítica. Será que vamos acabar nos convencendo de que nada neste mundo, por ser efêmero, nos faz falta? Ou o que fazemos é de menor interesse? Segundo os critérios de quem?
Como assídua leitora de tantos colunistas de várias áreas, estou sempre recortando seus textos, lendo-os para minha neta Alice ou nos meus cursos, por envolverem questões complexas, reflexões da maior significância. Mas nós, artistas visuais, parecemos não estar em parte alguma. Artistas são merecedores de maior respeito, pois supõe-se que criam coisas inteligentes. Além disso, o público do Rio de Janeiro não pode ficar à mercê de uma única opinião, unívoca.
Se há uma situação de inércia pela incapacidade de alguns de dar conta de uma diversidade mais complexa da produção contemporânea, podemos ao menos sugerir um revezamento nos jornais de críticos do maior valor ético como Fernando Cocchiarale, Márcio Doctors, Ricardo Basbaum, Paulo Sérgio Duarte, Reynaldo Roels, Ligia Canongia, Paulo Reis, Lauro Cavalcanti, Adolfo Montejo Navas, entre outros que provavelmente desconheço pela própria falta de visibilidade desse setor. São autores que defendem pontos de vista diversos, como sói existir num sistema onde o circuito de arte poderia funcionar com eficácia.
Anna Bella Geiger é artista plástica.
Texto publicado no Jornal do Brasil em 19-03-2004