Críticas


GAROTAS DO ABC

De: CARLOS REICHENBACH
Com: MICHELLE VALLE, FERNANDO PAVÃO, SELTON MELLO
31.08.2004
Por Daniel Schenker
DISTANTE DA MARCA DA PERIFERIA

Garotas Do ABC remete a Anjos Do Arrabalde , do mesmo Carlos Reichenbach. O cotidiano das funcionárias da fábrica de São Bernardo do Campo evoca o dia-a-dia das três professoras do subúrbio paulistano do trabalho anterior e o retorno de atores como Ênio Gonçalves e Vanessa Alves reforça a lembrança. Mas, para além do fato de que mais de 15 anos separam ambas as realizações, algo mudou. Diferentemente da produção de meados dos anos 80, esta não traz a marca da periferia.

Reichenbach não demonstra intimidade com a geografia que filma. Quase tudo soa encenado, em Garotas Do ABC : a tentativa de explorar o documental dentro da estrutura da ficção, o desenho vago de personagens circunstanciais, os diálogos repletos de frases prontas. De certo modo, o filme é propositadamente frouxo, tendo em vista que o cineasta assumiu sua intenção de apresentar diversas mulheres que deverão ganhar, cada qual, um trabalho à parte. Talvez pelo fato de inserir situações sem buscar qualquer aprofundamento, Carlos Reichenbach tenha optado por não manter o divertido título Aurélia Schwarzenega , mesmo que o filme esteja mais centrado em Aurélia do que em outras empregadas da fábrica. Em todo caso, eventuais explicações não justificam o resultado, prejudicado por seqüências sem função dramática (em especial, as cenas de dança no Clube Democrático).

A identidade de Garotas Do ABC aparece com alguma timidez no investimento numa protagonista que assume com despudor seu desejo por homens na linha Arnold Schwarzenegger (a transição para o modelo Bruce Lee denunciaria uma visão moralista de amadurecimento na administração da sexualidade?), na exploração de um elemento sinistro (a ameaçadora máquina nº 17 da fábrica) e na construção de uma personagem, Sofia (interpretada por Vera Mancini, justa vencedora do prêmio de melhor atriz coadjuvante no último Festival de Brasília), alcoólatra arruinada, fim de linha, que vaga noite após noite pela sinuca que serve de ponto de encontro de um grupo nazifascista. Ultrapassando a fronteira de uma decadência representada, Sofia seria a alma do filme que Carlos Reichenbach provavelmente gostaria de ter realizado.



# GAROTAS DO ABC

Brasil, 2003

Direção: CARLOS REICHENBACH

Roteiro: CARLOS REICHENBACH e FERNANDO BONASSI

Produção: SARA SILVEIRA

Fotografia: JACOB SARMENTO SOLITRENICK

Montagem: CRISTINA AMARAL

Trilha Sonora: NELSON AYRES

Elenco: MICHELLE VALLE, FERNANDO PAVÃO, SELTON MELLO, VANESSA ALVES, VERA MANCINI, ÊNIO GONÇALVES, NATÁLIA LORDA, LUCIELE DI CAMARGO, VANESSA GOULART, ADRIANO STUART

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