Críticas


TAVERNIER: ‘UM FILME É UMA CARTA DE AMOR’

26.09.2002
Por Luciano Trigo
TAVERNIER: ‘UM FILME É UMA CARTA DE AMOR’

Entre 1940 e 1944, na França ocupada pelos nazistas, uma produtora de cinema alemã contratou pretigiosos profissionais locais e realizou cerca de 30 filmes, e entre eles alguns se tornaram clássicos do cinema francês. O diretor Bertrand Tavernier decidiu visitar esse período difícil da História através da trajetória de dois personagens reais que tiveram que se confrontar com enormes desafios: Jean Devaivre, diretor, e Jean Aurenche, poeta e roteirista. Em duas horas e 50 minutos, seu filme Passaporte Para a Vida (Laissez Passer), um dos destaques do Festival do Rio BR 2002, discute a necessidade de se fazer escolhas e a possibilidade de formas alternativas de resistência.



Era possível para um profissional do cinema continuar trabalhando sem trair seu país? Era viável resistir às idéias impostas pelos alemães durante o regime de Vichy? Aurenche e Devaivre provaram que sim. “Não se trata de dividir os franceses entre resistentes e colaboradores”, explica Tavernier. “As coisas não eram tão simples”. Por isso, Laissez Passer evita qualquer espécie de julgamento moral, limitando-se a registrar o cotidiano de gente comum ligada ao cinema, em 1942.



Bertrand Tavernier nasceu em Lyon, em 1941. Trabalhou como crítico, roteirista, ator e assistente de direção antes de dirigir seus próprios filmes. O primeiro foi O Relojoeiro de St. Paul (1973), seguindo-se O Juiz e o Assassino (1976), La Mort en Direct (1980) e Por Volta da Meia-Noite (1986, com o saxofonista americano Dexter Gordon). Teve atuação marcante na política cultural de seu país, presidindo entidades como a Sociedade de Realizadores Franceses e a Associação de Realizadores Europeus, e comandou debates sobre as leis de produção e distribuição do cinema e dos direitos autorais, contribuindo decisivamente para que a França seja o país com a legislação mais avançada do mundo em matéria de cinema. Também escreveu livros hoje considerados clássicos, como Trinta Anos de Cinema Americano.



Intelectual politicamente engajado, Tavernier encabeçou, ainda, movimentos de lutas pelos direitos sociais e em defesa dos imigrantes, o que o levou a dirigir diversos documentários políticos, um deles sobre a Guerra da Argélia. Um de seus últimos filmes, Histoires des Vies Brisées, fala sobre os problemas dos imigrantes ilegais que são extraditados da França depois de viverem anos no país, rompendo todos os seus laços familiares e sociais e voltando para um lugar que já não conhecem.



Nesta entrevista exclusiva, concedida durante o último Festival de Cinema de Mar del Plata, Bertrand Tavernier falou sobre Laissez Passer e passou em revista temas importantes de sua obra.



Críticos.com.br - Muitos cineastas franceses, como François Truffaut e Jean-Luc Godard, começaram como críticos. Fale sobre a sua própria experiência como crítico de cinema.

BERTRAND TAVERNIER - Eu nunca me considerei um crítico, só escrevia sobre cinema como uma forma de ganhar a vida antes de poder dirigir meus próprios filmes. Fui mais um historiador e um explorador que um crítico, e tentava falar apenas sobre os diretores de que gostava. E também escrevi livros sobre a História do cinema americano. Hoje lamento os poucos artigos negativos que escrevi, entre eles uma crítica a Cão Raivoso, de Kurosawa. Eu simplesmente não tinha entendido o filme, que hoje considero magnífico. Mas o que me diferencia dos críticos de cinema é justamente isso: eu confesso os meus equívocos (risos).



Críticos.com.br - Qual é sua avaliação da “política dos autores”, que revolucionou o cinema francês nos anos 60?

BERTRAND TAVERNIER - Nunca soube o que significa a política dos autores. Se é uma expressão que serve para afirmar que o diretor é o autor de um filme, tudo bem. Mas esta não é uma regra absoluta. Em muitos casos, existe uma negociação com o roteirista e o produtor, e às vezes o diretor é um mero executor.



Críticos.com.br - E como você analisa hoje a Nouvelle Vague?

BERTRAND TAVERNIER - Um crítico chegou a escrever , sobre Laissez Passer: “A Nouvelle Vague é a grande ausente deste filme. Ora, isso é o mesmo que lamentar que o cinema iraniano esteja ausente nos filmes de Stanley Kubrick. Não nego a importância da Nouvelle Vague, mas existem outras maneiras de se fazer cinema. Alguns críticos revelam uma incapacidade absurda de entender que se pode fazer um filme sobre uma realidade que não tem nada a ver com a nossa. Nenhuma escola isoladamente pode ter a pretensão de representar a modernidade, porque há dez maneiras diferentes de ser moderno. Tenho medo deste tipo de postura. Afinal de contas, a globalização é moderna, então opor-se a ela seria uma atitude reacionária? Além disso, no cinema, só se sabe se um filme é realmente moderno dez ou 20 anos após sua realização.



Críticos.com.br - Como nasceu a idéia de filmar Laissez Passer?

BERTRAND TAVERNIER - Antes de tudo, nasceu do meu desejo de explorar um momento da História que eu não conhecia em sua totalidade. É difícil resumir em poucas palavras um filme que levei três anos para fazer. Meu mestre Michael Powell, diretor de O Ladrão de Bagdá, dizia que fazia filmes para aprender. Eu queria ser o autor dessa frase, pois sempre filmo para aprender. No caso, a minha curiosidade era saber mais a respeito de como era a vida dos cineastas e da gente ligada ao cinema durante a Ocupação. Ou seja, quis investigar um momento da História que eu não conhecia bem, e depois quis compartilhar as minhas descobertas sobre os bastidores da produtora Continental, dirigida pelo alemão francófilo Alfred Greven, que conhecia e admirava o trabalho de Henri-Georges Clouzot. Goebbels, que aliás também era um grande admirador do cinema, enviou Greven para a França porque os dois estavam apaixonados pela mesma atriz, e assim ele eliminava um rival (risos). Há muito tempo eu queria fazer um filme passado durante a Ocupação, mas não encontrava o ângulo certo. Foi meu encontro com Jean Devaivre, com suas lembranças, além de histórias fantásticas que outras pessoas me contaram sobre ele e Auranche, que me fez começar a trabalhar, pois tinha um tema fabuloso nas mãos. Porque uma época, por si só, não constitui um tema, e sim os percursos individuais. Então a época se manifesta através de personagens singulares, de sentimentos pessoais, como a dor, o medo, a insegurança provocada pelos bombardeios, pelos controles de tráfego etc. Trabalho com pontos de vista precisos, concretos.



Críticos.com.br - O filme coloca a questão da escolha que os profissionais de cinema tiveram que fazer durante a Ocupação...

BERTRAND TAVERNIER - Sim, e cada escolha podia ser decisiva. Durante aqueles quatro anos houve diversas formas de resistência. Eram profissionais no exercício de sua atividade, que precisavam provar que não tinham sido esmagados pelos nazistas. Por exemplo, a fidelidade de Jean Devaivre ao roteiro corajoso de Maurice Tourneur em La Main du Diable já foi uma forma de resistir, ou pelo menos de não se resignar. Devaivre resistia de forma instintiva, enquanto Jean Auranche, mais intelectual, racionalizava a resistência. Mas é difícil traçar a fronteira exata entre uma conduta digna e outra nem tanto. E eu não queria apontar bandidos e mocinhos, mas simplesmente tentar compreender como os diretores, roteiristas, técnicos, atores e figurantes reagiam ao serem confrontados com essa situação. O que me interessava eram as escolhas das pessoas comuns, menos conhecidas, investigar qual era a fronteira entre fazer um trabalho honesto e se comprometer, entre a necessidade de sobreviver e o risco de colaborar com os nazistas. Muitas vezes eu mesmo me perguntei: como eu teria agido? Acho que, num filme de época, o acúmulo de informações e o cuidado com a reconstituição importam menos que colocar as questões certas, aquelas das quais não se conhecem de antemão as respostas.



Críticos.com.br - Foi uma época boa do cinema francês, apesar da Ocupação?

BERTRAND TAVERNIER - Durante a Ocupação, o cinema deveria ser basicamente uma distração, mas em muitos casos também serviu para dar coragem às pessoas. Os filmes não passavam mensagens explícitas de resistência, seria impossível, mas conseguiam suscitar uma nova esperança, um impulso de combate à resignação. E, mesmo com a pressão nazista, foram feitos filmes muito interessantes. Clouzot dirigiu obras-primas, como O Corvo, mas depois sofreu uma perseguição atroz, só sendo reabilitado muitos anos mais tarde, quando se reconciliou com o Partido Comunista e pôde realizar O Salário do Medo e Retour à la Vie, uma reflexão magnífica sobre a tortura, a história de um professor que esconde um nazista em casa para tentar compreender como um ser humano pode se transformar num carrasco. Na época da Liberação, em 1943, Clouzot foi impedido de trabalhar, chegou a receber ameaças anônimas, e panfletos violentos foram escritos contra seus filmes. Disseram muitas mentiras a seu respeito. Georges Sadoul chegou a afirmar que O Corvo reproduzia a ideologia de Minha Luta, de Hitler, quando era justamente o contrário. Ele foi um diretor genial, que entre outras coisas filmou Picasso pintando um quadro em tempo real. Ele precisa ser redescoberto. Mas é claro que não se pode dizer que aquela foi uma época de ouro do cinema francês, pois muitos técnicos foram deportados ou assassinados, os judeus eram proibidos de trabalhar e tinham que se esconder etc. Mostro em Laissez Passer que era comum um figurante ser preso e deportado no meio de uma filmagem.



Críticos.com.br - O filme cita diversas pessoas reais...

BERTRAND TAVERNIER - De certa forma, Laissez Passer é uma declaração de amizade a diversos profissionais que admiro, gente que conseguiu fazer um trabalho íntegro, de resistência, apesar da censura e das proibições, como Auranche e Devaivre. Foi Auranche, o herói dessa história, quem me ensinou o gosto pela liberdade e o sentido da revolta, mas também o senso de humor necessário a um cineasta. Ele e outros personagens me colocaram questões sobre a responsabilidade individual em épocas de crise. Meu pai, que dirigiu uma revista em que colaborou Louis Aragon e teve problemas com o governo de Vichy, me falava o tempo todo da responsabilidade das palavras. Ele me ensinou que escrever um artigo é um ato de tanta coragem quanto disparar um revólver, que uma pessoa pode resistir sem se engajar fisicamente: resistir intelectualmente, recusando determinadas idéias... Apesar de ser absolutamente contra a violência, lembro que ele achava que o escritor Robert Brasillac devia ser espancado, por ter escrito coisas infames sobre os os judeus, que comparava a símios, em artigos e livros de 1942, além de ter denunciado escritores judeus que mudaram de nome para se proteger. Em compensação, tiveram uma conduta exemplar homens como Jean-Paul Le Chanois, que apesar de suas mudanças de posição em relação ao comunismo foi um resistente de primeira hora, e Charles Spaak, que chegou a escrever um roteiro na prisão.



Críticos.com.br - Mas de que forma era possível passar uma mensagem de resistência em filmes produzidos pelos alemães?

BERTRAND TAVERNIER - Escrever um roteiro que não apoiasse explicitamente o nazismo já era uma forma de resistência. Lembro de um filme de Claude Autant-Lara que mostrava uma aristocrata visitando uma casa muito humilde e dizendo a seus moradores que era necessário ter paciência e resignação – era esta a mensagem do Marechal Pétain aos franceses – e outro personagem responde dizendo que não, ao contrário, era preciso desejar a impaciência e a revolta. Ou seja, era uma mensagem claramente subversiva, num filme realizado em plena Ocupação. Foi um ato de extrema coragem, e como ele muitos outros artistas correram riscos. Da mesma forma foi um ato de coragem do inglês Michael Powell filmar Paralelo 49 no Canadá, no mesmo ano, exortando os americanos a entrarem na guerra, atravessando o oceano infestado de submarinos alemães. Eu entrevistei muitas pessoas que viveram a Ocupação, a realidade de um país humilhado, batido, moralmente destruído, e que encontravam conforto nos filmes íntegros, de qualidade e ambição artística, que alguns cineastas insistiam em fazer. Filmes que despertavam orgulho e sentimentos fortes, quando a ordem era fazer filmes leves, menos ambiciosos, de entretenimento. Uma cena do Laissez Passer é inspirada nas memórias de Georges Hiverneau, que conta que estava desesperado, na prisão, quando viu outro prisioneiro escrevendo a lápis, em papel de pão, sobre Stendhal. Isso lhe deu uma coragem imensa. Quando fiz meu primeiro filme, quis trabalhar com profissionais que tiveram uma atitude digna e estavam desempregados, às vezes por causa de uma crítica negativa de Truffaut. Ele, como André Bazin e Roger Tailleur cometeram alguns erros graves de avaliação, como outros intelectuais de inspiração maoísta, e nunca se retrataram, não só em relação ao cinema. Philippe Sollers foi tratado como um agente da CIA, por exemplo, e George Orwell foi criticado por denunciar o stalinismo. A imprensa comunista os atacou com uma violência execrável.



Críticos.com.br - A arte continua sendo uma arma de resistência?

BERTRAND TAVERNIER - Em todas as épocas, e agora mais do que nunca, a arte é uma arma, algo que nos dá coragem e calor. A arte, seja no cinema, na música ou no teatro, é a resposta número um a tudo o que nos ameaça, às ditaduras, aos integrismos religiosos, ao liberalismo econômico ultrajante, à globalização, ao monopólio da imagem. A curiosidade intelectual, a paixão artística e o espírito aberto são as respostas a essas ditaduras. Mas o fato é que hoje existem ditaduras muito mais difíceis de combater que as tiranias políticas, em que era fácil identificar o inimigo. Hoje as ditaduras não têm rosto, é difícil identificar os responsáveis pela globalização.



Críticos.com.br - Você acha que faltam ideais à nova geração de cineastas?

BERTRAND TAVERNIER - Algumas pessoas lutam, mas de forma diferente, em outros campos de batalha. Mas muitos são individualistas e não enxergam nenhuma causa para lutar. Acho que existem pontos comuns entre o passado e o presente, e que podemos tirar do passado uma lição, aprender com seu “espírito” de resistência, que nossa época também exige. A idéia de resistência não me parece velha nem ridícula, absolutamente.



Críticos.com.br - Você já foi criticado por praticar um modelo de cinema clássico, conservador...

BERTRAND TAVERNIER - Não defendo o cinema clássico de forma alguma, muito menos em Laissez Passer. É uma crítica estúpida, meu estilo é totalmente oposto aos dogmas do cinema clássico, em relação à estrutura narrativa – em Laissez Passer não existe um clímax apoteótico, por exemplo – mas também no uso da luz, de cenários naturais, sem estúdios, nos diálogos. Por exemplo, a iluminação reforça a idéia de uma Paris esmagada, cinzenta, de uma forma ausente no cinema clássico. O fato é que um cineasta como Robert Altman me influenciou muito mais que os diretores clássicos dos anos 40 – com exceção de Jean Renoir, pela liberdade narrativa de filmes como “A grande ilusão”. Contesto essa crítica, ela é idiota, falsa e absurda. Muitos atacaram também a longa duração do filme (2h50), mas estou convencido de que ela é necessária. Há uma espécie de tensão, de incerteza, de complexidade, que só encontrariam expressão num ritmo lento. Os movimentos de câmera traduzem a indecisão dos personagens – movimentos caóticos, incertos, que correspondem ao caos interior dos personagens. E no entanto Laissez Passer recebeu críticas muito duras, chegaram a me acusar de fazer o elogio da colaboração! Ou a afirmar que eu acho que a Ocupação foi benéfica para o cinema francês, e que a Nouvelle Vague teria rompido essa situação idílica. É uma vergonha. Tenho a impressão de estar lutando contra encíclicas papais, que colocam, de um lado, Godard e Truffaut, de outro Clouzot e Autant-Lara.



Críticos.com.br - Você enxerga o protagonista de Laissez Passer como um herói romântico?

BERTRAND TAVERNIER - Não é um romântico. Talvez se possa considerá-lo um herói, se entendermos por herói alguém que faz o que pode, enquanto os outros não o fazem. Mas em diversos momentos ele age sem refletir, por convicção e por instinto. Tem a sorte da coragem inconsciente. É capaz de percorrer 300 quilômetros de bicicleta para ver sua mulher, mas nunca diz a ela “eu te amo”... Mas o trajeto não deixa de ser uma prova de amor.



Críticos.com.br - Que importância você atribui ao roteiro?

BERTRAND TAVERNIER - Um bom roteiro é como uma carta de amor que o roteirista entrega ao diretor. E o diretor responde com outra carta de amor, que é o filme em si.



Críticos.com.br - Qual foi a repercussão de Laissez Passer na França?

BERTRAND TAVERNIER - Extraordinária. A maioria das críticas, apesar das exceções que já citei, considerou que se trata de meu melhor filme, e recebi cartas emocionadas de centenas de espectadores. Eu me sinto feliz quando recebo cartas de jovens que só viam filmes americanos e me escrevem depois de ver Laissez Passer na escola. E recebi dois prêmios no Festival de Berlim. É o meu filme de que mais gosto, ao lado de Le Juge et L’Assassin (1975), Um Sonho de Domingo (1984) e Quando Tudo Começa (1999). O que menos gosto é Que la Fête Comence (1974). Mas procuro não rever meus filmes.



Críticos.com.br - Você está trabalhando na restauração dos filmes dos irmãos Lumière?

BERTRAND TAVERNIER - Sim, e queremos lançá-los em DVD. Parte do material já foi lançado nos Estados Unidos, com enorme sucesso. Os irmãos Lumière fizeram mais de 1200 filmes, alguns quase desconhecidos, como um curta-metragem filmado no México. Também pretendo aprofundar o meu diálogo com os cineastas latino-americanos, e por isso vim ao festival de Mar del Plata.



Críticos.com.br - O que você achou da indicação de O Fabuloso Destino de Amélie Poulain ao Oscar de melhor filme estrangeiro? A França esteve bem representada?

BERTRAND TAVERNIER - Não sei se Amélie é um filme moderno, mas certamente é um filme de autor, tem qualidade e estilo. Muitas críticas que lhe fizeram nasceram da inveja.



Críticos.com.br - Sua obra é bastante eclética. Por que seus filmes são tão diferentes uns dos outros?

BERTRAND TAVERNIER - A imaginação também é sinônimo de qualidade. Muitos diretores que admiro também são ecléticos: Stanley Kubrick, Michael Powell, Kurosawa... Mas existe uma conexão entre todos os seus filmes, que os críticos nem sempre percebem. Da mesma forma, creio que todos os meus filmes tratam do mesmo tema, com abordagens diferentes. Para mim existem dois tipos de cineastas, os que sempre fazem a mesma coisa, como Ingmar Bergman e Eric Rohmer, e os que buscam temas e culturas diferentes ao longo dos anos, transformando-se continuamente, como John Ford e Jean Renoir. Mas não são categorias absolutas, já que o último filme de Rohmer, A Inglesa e o Duque, marca uma grande mudança na sua obra.



Críticos.com.br - Você já escreveu dois livros sobre o cinema americano. Como avalia as produções hollywoodianas hoje?

BERTRAND TAVERNIER - Nos últimos 15 ou 20 anos, o cinema americano mudou para pior. Por um lado, se produzem cada vez menos filmes de reflexão, para adultos, e cada vez mais filmes de entretenimento, com orçamentos milionários e cheios de efeitos especiais, em que a ação do diretor é quase nula. Por outro, os cineastas que tentam escapar deste modelo acabam fazendo sempre o mesmo tipo de filme independente despretensioso sobre realidades locais, questões da classe média etc. A quantidade de “primeiros filmes” é impressionante, mas raros são os cineastas estreantes com uma carreira longa pela frente. Mais importante que isso, porém, é a pressão do mercado e da indústria. Não quero impedir a difusão dos filme americanos, mas defendo a preservação das cinematografias nacionais, a criação de outros tipos de cinema. O debate em torno das leis de produção e distribuição constituem uma verdadeira batalha. Felizmente alguns cineastas americanos, como Steven Spielberg, já perceberam que é importante que cada país tenha uma cinematografia forte e saudável.



Filmografia do cineasta Bertrand Tavernier:



1973 – L’Horlogier de St-Paul (O Relojoeiro de St. Paul)

1975 – Le Juge et L’Assassin (O Juiz e o Assassino)

1980 – La Mort en Direct (A Morte ao Vivo)

1981 – Coup de Torchon

1984 – Un Dimanche à la Campagne (Um Sonho de Domingo)

1986 – Round Midnight (Por Volta da Meia-Noite)

1989 – La Vie et Rien D’Autre (A Vida e Nada Mais)

1990 – Daddy Nostalgie

1993 – Loi 627

1996 – Capitaine Conan (Capitão Conan)

1999 – Ça Commence Aujourd’Hui (Quando Tudo Começa)

2002 – Laissez Passer (Passaporte Para a Vida)

Voltar
Compartilhe
Deixe seu comentário