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CANNES 2022: OS PREMIADOS E UM BALANÇO

28.05.2022
Por Marcelo Janot
Após dois anos tenebrosos por causa da epidemia de Covid-19, na verdade o grande vencedor foi o cinema.

Ao anunciar a Palma de Ouro para o grande vencedor do 75o Festival de Cannes, o sueco “Triangle of Sadness”, de Ruben Östlund, o presidente do júri, o ator francês Vincent Lindon, revelou que ele e seus companheiros (entre eles cineastas como Asghar Farhadi, Jeff Nichols, Joachim Trier e Ladj Ly) ficaram em estado de choque após assistirem ao filme. Devem ter saído da sessão com impressão parecida com a minha, pois sob forte entusiasmo declarei na ocasião, em vídeo postado no Instagram, que dificilmente haveria um filme mais forte na competição e que poderíamos estar diante do “Parasita” de 2022, um fenômeno que ganharia tudo o que viesse pela frente.

Quando recebeu o prêmio, Östlund ressaltou o que já havia dito na conferência de imprensa: que seu filme se comunica de forma extraordinária com o público e ao mesmo tempo provoca reflexão. É algo louvável, que muitos cineastas tentam mas não conseguem, enquanto outros tantos preferem obras mais herméticas que dialogam com um nicho mais específico, o que também faz parte do jogo desde que, assim como “Triangle of Sadness”, resultem em bom cinema.

De uma maneira geral, o balanço dos 21 filmes em competição foi positivo. Premiações são sempre polêmicas por serem excludentes – nunca haverá unanimidade, sobretudo num festival como o de Cannes, em que uma norma determina que cada filme só pode receber um prêmio. O júri deste ano foi ainda mais generoso, distribuindo 2 Grandes Prêmios do Júri e 2 Prêmios do Júri (o que equivaleriam a “medalhas” de prata e de bronze), sem contar com um Prêmio Especial criado em razão da comemoração de 75 anos do evento. Portanto, a metade dos concorrentes ganhou alguma coisa.

Na verdade o grande vencedor foi o cinema. Após dois anos tenebrosos por causa da epidemia de Covid-19, em que a produção e a exibição foram duramente prejudicadas, com o público migrando para o streaming, foi um alívio tremendo e motivo de festa ver tantos filmes de diretores jovens e veteranos, de todas as partes do mundo, lotando as salas de cinema.

E até que ponto já se notam reflexos da pandemia como inspiração artística? Ela está presente diretamente em filmes fracos como “Stars at Noon”, de Claire Denis, por exemplo, que se passa na Nicarágua em que personagens usam máscara e fazem teste de Covid, ou indiretamente, como no belo “Les Amandiers”, de Valeria Bruni Tedeschi, associada às mortes precoces provocadas pela até então incontrolável Aids no meio artístico nos anos 80.

Vimos outros temas urgentes, como a perigosa mistura de religião e política, o preconceito contra imigrantes, os abismos econômicos e sociais, tratados ficcionalmente de forma explícita ou metafórica, além da matéria-prima inesgotável que são os dramas que envolvem complexas relações familiares.

Decepções? Sempre existirão, mas nesse momento talvez seja melhor olhar para o todo e acreditar no cinema que ressurge e se fortalece para o futuro. Sob um prisma bem pessoal, após dois anos sem pisar num cinema e voltado para o estudo e o resgate de pérolas do passado para os inúmeros cursos online que lecionei durante a pandemia, esse Festival de Cannes teve em mim uma função terapêutica. Me reconectei com o cinema do presente vendo 30 filmes inéditos em 11 dias, e agora já não vejo a hora de me enfurnar em um cinema outra vez.



RELAÇÃO DE VENCEDORES – COMPETIÇÃO PRINCIPAL

- Palma de Ouro – “Triangle of Sadness”, de Ruben Östlund

- Grande Prêmio do Júri – “Close”, de Lukas Dhont, e “Stars at Noon”, de Claire Denis

- Prêmio do Júri – “Le Otto Montagne”, de Felix Van Groeningen e Charlotte Vandermeersch, e “EO”, de Jerzy Skolimowski

- Melhor Direção – Park Chan-wook (“Decision to Leave”)

- Melhor Roteiro - Tarik Saleh (“Boy From Heaven”)

- Melhor Atriz - Zar Amir-Ebrahimi (“Holy Spider”)

- Melhor Ator - Song Kang-ho (“Broker”)

- Prêmio do 75th Festival – “Tori et Lokita”, de Jean-Pierre e Luc Dardenne

Não oficiais (outros júris):

- Prêmio da Crítica Internacional (FIPRESCI) – “Leila’s Brothers”, de Saeed Roustaee

- Prêmio do Júri Ecumênico – “Broker”, de Hirokazu Kore-eda

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